Nathália Guedes Brum
Advogada do Escritório Marcos Martins Advogados
A assistência judiciária gratuita foi criada com a finalidade de possibilitar amplo e irrestrito acesso à justiça para todos aqueles que não possuam condições de arcar com as custas e despesas provenientes do processo, seja pessoa física ou pessoa jurídica.
Neste sentido, o artigo 5º, inciso LXXIV, da Constituição Federal, dispõe que “o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos“.
O Código de Processo Civil, por sua vez, possui normas e requisitos específicos para o deferimento do benefício, sendo certo que a insuficiência de recursos mencionada pelo artigo 98 do referido códex, deve ser comprovada pela parte que requer a concessão do benefício e dependerá da análise individual de cada caso concreto e das evidências da impossibilidade financeira da parte para recolhimento das custas, como dificultador de seu direito constitucional de acesso ao Poder Judiciário.
O juiz pode indeferir a pretensão se houver nos autos fundadas razões que evidenciem a falta de pressupostos para a concessão da benesse, observada a regra do artigo 99, § 2º do CPC[1].
Contudo, em tempos de coronavírus, os pressupostos legais para concessão da gratuidade devem ser flexibilizados e melhor analisados pelo Magistrado, uma vez que, em várias situações, os documentos antes utilizados como meio comprobatórios da hipossuficiência financeira, como declaração de imposto de renda e extratos bancários, por exemplo, não prestarão para retratar a realidade do momento posterior à crise da pandemia.
Isto porque, ainda que se observe nas declarações de Imposto de Renda a existência de bens imóveis ou rendimentos consideráveis de pessoas jurídicas, estes estão fatalmente prejudicados pelo cenário econômico atual, uma vez que diversos estados adotaram medidas restritivas de prevenção, desde a declaração de existência de calamidade pública no país em razão da pandemia da Covid-19, como o distanciamento social e quarentena, com determinação de fechamento de comércio e atividades econômicas não essenciais.
Assim, devem ser considerados para a concessão do benefício no momento atual, a falta de liquidez dos negócios, as previsões de retomada da economia e os impactos que as medidas de distanciamento social e quarenta podem ter causado no funcionamento das empresas, manutenção dos empregos e dificuldade de recolocação no mercado de trabalho.
Neste contexto, não pode ser negado acesso à justiça ao empresário, especialmente de pequeno e médio porte, que não possua condições de arcar com as custas do processo para rever contratos bancários, por exemplo, desde que reste comprovado como a pandemia atual impactou o seu negócio e, como, momentaneamente, haverá necessidade de concessão do benefício.
Ademais, os parágrafos 2º e 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil[2] deixam claro a suspensão da responsabilidade relativamente às custas e honorários advocatícios em caso de sucumbência, podendo estes serem executados até cinco anos subsequentes ao trânsito em julgado, caso fique comprovado que a insuficiência de recursos deixou de existir.
Outro ponto a ser observado nesse momento excepcional de retração econômica é a possibilidade de diferimento do pagamento das custas ao final do processo, ou a redução no percentual das despesas ou, ainda, o parcelamento das custas processuais, previstos nos parágrafos 5º e 6º do artigo 98 do Código de Processo Civil[3], o que pode ser pedido em caráter alternativo, viabilizando, desta forma, o acesso universal à Justiça.
Em decisão recente, proferida nos autos do agravo de instrumento nº 2055385-98.2020.8.26.0000, sob relatoria do Desembargador Marcos Pimentel Tamassia, da 1ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, foi concedido o diferimento das custas processuais pela incapacidade presumida do agravante, em decorrência da situação excepcional gerada pela pandemia da Covid-19.
Nestes termos, a incapacidade momentânea de arcar com as custas do processo, provenientes do cenário econômico atual, atualmente prejudicado pela pandemia da Covid-19, não pode ensejar qualquer tipo de óbice ao acesso à justiça, sendo necessária a flexibilização dos pressupostos legais para concessão do benefício de gratuidade de justiça e/ou a concessão de medidas alternativas, como o diferimento, redução ou parcelamento das custas, bastando, para tanto, apenas a presunção da incapacidade financeira do requerente.
O escritório Marcos Martins Advogados está atento à essas possibilidades e buscará assessorá-lo da melhor forma para garantir seus direitos e acesso ao Judiciário durante esse período excepcional de pandemia do novo coronavírus.
[1] Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso.
(…)
§ 2º O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos.
[2] §2º A concessão de gratuidade não afasta a responsabilidade do beneficiário pelas despesas processuais e pelos honorários advocatícios decorrentes de sua sucumbência.
§3º Vencido o beneficiário, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos 5 (cinco) anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário.
[3] § 5º A gratuidade poderá ser concedida em relação a algum ou a todos os atos processuais, ou consistir na redução percentual de despesas processuais que o beneficiário tiver de adiantar no curso do procedimento.
§ 6º Conforme o caso, o juiz poderá conceder direito ao parcelamento de despesas processuais que o beneficiário tiver de adiantar no curso do procedimento.