Marília Silva de Melo
Advogada do Escritório Marcos Martins Advogados
Uma das grandes peculiaridades na Justiça laboral é a exigência do depósito recursal para interposição de recursos, disciplinado pelo artigo 899 e parágrafos da CLT.
O depósito recursal serve como uma forma de garantir o Juízo previamente, sendo que seus valores são regulamentados pelo Tribunal Superior do Trabalho e reajustados anualmente. Atualmente, o valor para interposição de Recurso Ordinário é de R$ 9.828,51, e nos casos de Recurso de Revista, Recurso de Embargos, Recurso Extraordinário e Recurso em Ação Rescisória, o valor é de R$ 19.657,02.
Ocorre que desde novembro de 2017, com as alterações trazidas pela Lei 13.467/2017, o depósito recursal pode ser substituído por fiança bancária ou seguro garantia judicial, conforme passou a disciplinar o incluso parágrafo 11 do artigo 899 da CLT.
A fiança bancária, consiste em um contrato em que uma instituição bancária, no papel de fiador, garante o cumprimento do trato firmado entre o afiançado e seu credor. O banco emite uma carta fiança com prazo máximo, que será demonstrada pelo contratante em eventual cobrança ou execução pelo credor. Cumpre esclarecer que a fiança bancária é regulada pelo Banco Central (BACEN).
Já o seguro garantia é uma relação contratual onde o tomador paga um prêmio para uma seguradora assegurar o cumprimento das obrigações contratuais. Na hipótese de seguro garantia, a seguradora poderá responder integralmente por essa gestão, até o valor da garantia prevista na apólice. O seguro garantia é regulado pela Superintendência de Seguros Privados (SUSEP).
Cabe apontar, argumentativamente, que normalmente, a carta Fiança Bancária é mais onerosa do que o Seguro Garantia e compromete o limite de crédito da empresa junto aos Bancos.
A fiança bancária e o seguro garantia judicial no processo trabalhista antes da entrada em vigor da Lei 13.467/2017 já eram aceitos, porem somente em processos que já se encontravam em fase de execução, para penhora e garantia do Juízo, já que aplica-se o quanto disposto no artigo 835, §2º do Código de Processo Civil, aplicado subsidiariamente ao processo trabalhista, da qual prevê que para fins de substituição da penhora, a fiança bancária e o seguro garantia judicial, equiparam-se a dinheiro, desde que em valor não inferior ao do débito constante da inicial, acrescido de 30%.
Assim, caso uma empresa que tivesse um processo trabalhista já em fase de execução e quisesse garantir o Juízo, poderia ao invés de realizar o depósito do saldo executado, garanti-lo por meio da fiança bancária ou do seguro garantia judicial do valor acrescido de 30%.
Pois bem, desde novembro de 2017 então passou-se a poder utilizar-se de tais alternativas para substituição do depósito recursal, fazendo que a empresa não disponha dos valores altos de seus caixas para ter acesso ao duplo grau de jurisdição.
Há que se ressaltar que em razão da omissão da CLT quanto aos 30% exigidos pelo CPC nos casos de garantia por meio da fiança bancária e do seguro garantia judicial, o TST regulamentou a questão por meio do Ato Conjunto TST.CSJT.CGJT nº 1, de 16 de outubro de 2019, que recentemente teve alguns de seus artigos alterados pelo Ato Conjunto TST.CSJT.CGJT nº 1, de 29 de maio de 2020, sendo que houve alteração nos artigos 7º e 8º do referido ATO da qual passou a dispor que para a substituição pela fiança bancária e seguro judicial serão observados os requisitos do Ato Conjuntivo bem como o quanto disposto no artigo 835, §2º do CPC que disciplina quanto ao acréscimo de 30% do valor.
A título exemplificativo, para uma empresa que possua em face de si uma reclamação trabalhista, caso tenha sido proferida uma sentença a qual lhe foi desfavorável, e esta queira interpor Recurso Ordinário para apreciação pelo Tribunal Regional do Trabalho, além do pagamento das custas processuais que somam 2% do valor da condenação, ainda terá que dispor do valor de R$ R$ 9.828,51 a título de depósito Recursal.
Entretanto, caso a empresa queira realizar a substituição do depósito recursal por fiança bancária ou seguro garantia judicial, deverá apresentar fiança bancária ou seguro garantia judicial no valor atual de R$ 12.777,06, compreendido pelo valor do depósito recursal para Recurso Ordinário acrescidos de 30% exigidos pela Lei.
Nos valores atuais exigidos a título de depósito recursal, para a empresa interpor recursos corriqueiros como o Recurso Ordinário, Recurso de Revista e Agravo de instrumento, a empresa terá que dispor de seus caixas a quantia de R$ 39.314,04! Já com a possibilidade de substituição pela carta fiança ou seguro garantia, mesmo que o valor da carta fiança e do seguro garantia judicial precisem ser acrescidos de 30%, a empresa não ficará com tais valores “inativados”, eis que depositados no processo, por aproximadamente cerca de três anos, média da duração de um processo na Justiça do Trabalho, mas que poderá permanecer no capital de giro da empresa, que pagará a dívida trabalhista apenas quando e quanto estiver definitivamente definida a sua procedência.
Para os processos que já estiverem em curso, e que por ventura a empresa já tenha realizado o depósito recursal em dinheiro, poderá também postular a referida substituição, uma vez que o Ato conjunto TST.CSJT.CGJT nº 1, de 29 de maio de 2020, alterou a redação do artigo 8º, que previa expressamente que tal substituição não poderia ocorrer, passando a dispor que para a substituição deverá ser formulado requerimento dirigido ao Juiz ou relator competente para decidir o pedido na fase em o processo se encontrar, seja na origem ou em fase recursal.
No mais, nosso ordenamento jurídico dispõe pela aplicação imediata e geral da lei processual, respeitando-se o vacatio legis, o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada, aliado ao fato do teor do artigo 835 do Código de processo Civil dispor que a fiança bancária e o seguro garantia são equiparados a dinheiro.
Assim, diante de um cenário crítico a qual a economia mundial vem e irá atravessar, tais substituições concedem folego as empresas que não dispõem de valores altos e em espécie, retirando-os de seus caixas e faturamentos imediatamente, podendo capitalizarem-se e investirem mais em seus negócios, sem precisarem abrir mão do direito constitucional de recorrer para as instâncias superiores.
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