Nathália Guedes Brum
Advogada do escritório Marcos Martins Advogados Associados
A Lei n° 11.101, de 09 de fevereiro de 2005 (Lei de Recuperação e Falências – LFR), extinguiu as concordatas e introduziu no ordenamento jurídico nacional a recuperação judicial do empresário individual e da sociedade empresária em crise, que explorem regularmente a atividade econômica há mais de dois anos.
Nos termos do artigo 47 da referida lei, a Recuperação Judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.
O empresário ou sociedade empresária em crise deve formular o pedido de Recuperação Judicial perante o Poder Judiciário, instruído com toda a documentação exigida no artigo 51 da LRF, dentre elas, a relação de todas as ações judiciais em que figure como parte, inclusive as de natureza trabalhista, com a estimativa dos respectivos valores.
Embora a Lei nº 11.101/2005 não trate da possibilidade de litisconsórcio ativo no processo de Recuperação Judicial, há entendimentos jurisprudenciais e doutrinários favoráveis ao tema, desde que configurem grupo econômico. Conforme Ricardo Brito Costa:
A formação do litisconsórcio ativo na recuperação judicial, a despeito da ausência de previsão na Lei n° 11.101/2005, é possível, em se tratando de empresas que integrem um mesmo grupo econômico (de fato ou de direito). Nesse caso, mesmo havendo empresas do grupo com operações concentradas em foros diversos, o conceito ampliado de ‘empresa’ (que deve refletir o atual estágio do capitalismo abrangendo o ‘grupo econômico’), para os fins da Lei n° 11.101/2005, permite estabelecer a competência do foro do local em que se situa a principal unidade (estabelecimento) do grupo de sociedades. O litisconsórcio ativo, formado pelas empresas que integram o grupo econômico, não viola a sistemática da Lei n° 11.101/2005 e atende ao Princípio basilar da Preservação da Empresa. A estruturação do plano de recuperação, contudo, há de merecer cuidadosa atenção para que não haja violação de direitos dos credores (COSTA, 2009, p. 182).
A partir do deferimento do processamento da recuperação judicial pelo Juízo ficam suspensas, durante o prazo de 180 (cento e oitenta) dias, todas as ações e execuções contra o devedor, com exceção das ações relativas à quantias ilíquidas; créditos trabalhistas perante a justiça do trabalho até a apuração dos respectivos valores; créditos fiscais; crédito de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujo contrato seja irrevogável ou irretratável, ou de proprietário em contrato de venda com reserva de domínio e de adiantamento de contrato de câmbio.
Com o deferimento do pedido, o Juiz nomeará um administrador judicial, que deverá ser profissional idôneo, preferencialmente advogado, economista, administrador de empresas ou contador, ou pessoa jurídica especializada, o qual funciona como intermediador entre o devedor, os credores e a Justiça.
Após a publicação do despacho do deferimento do processamento da recuperação judicial, o devedor tem o prazo improrrogável de 60 (sessenta) dias para apresentar o plano de recuperação à Justiça, sob pena de convolação em falência.
No plano, o devedor apresentará os meios que serão utilizados para a superação da crise. O artigo 50 da LRF prevê, em caráter exemplificativo, os meios utilizados para a recuperação judicial, dentre eles, a concessão de prazos e condições especiais para pagamento das obrigações vencidas ou vincendas, aumento de capital social, venda parcial dos bens, dentre outros.
Todos os titulares de créditos existentes na data do pedido de recuperação judicial, vencidos ou não vencidos, ficam sujeitos à recuperação judicial, com exceção dos especialmente previstos em lei.
Com exceção das dívidas trabalhistas, cujo prazo máximo para pagamento é de 01 (um) ano, na recuperação judicial não há limite legal para a prorrogação do pagamento das dívidas dos demais credores.
O plano de recuperação judicial é submetido à aprovação dos credores e, havendo objeção de qualquer credor, o juiz convocará a Assembleia Geral de Credores para deliberar sobre o plano de recuperação. Na Assembleia, os credores poderão apresentar alterações ao plano, desde que haja expressa concordância do devedor. A rejeição do plano implica na determinação legal da convolação da recuperação judicial em falência. Aprovado o plano e cumpridas as exigências de apresentação de certidões negativas de débitos tributários pelo devedor, o juiz concederá a recuperação judicial.
Conforme estabelecido no artigo 64 da Lei n° 11.101/2005, durante o procedimento de recuperação judicial, o devedor ou seus administradores serão mantidos na condução da atividade empresarial, sob fiscalização do Comitê, se houver, e do administrador judicial.
Assim, pode-se concluir que a possibilidade de recuperação judicial do empresário e da sociedade empresária, a partir da vigência da Lei 11.101/2005, ampliou o poder de negociação dos devedores e credores em compor seus interesses, o que contribui de forma positiva para a preservação das empresas em dificuldade econômico-financeira.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei 11.101 – Lei de Falência. (2005).
COSTA, Ricardo Brito. Recuperação judicial: é possível o litisconsórcio ativo? In: Revista do Advogado – Recuperação Judicial: temas polêmicos. Ano XXIX. São Paulo: AASP, n. 105, set, 2009.
CREPALDI, Silvio Aparecido. Recuperação judicial, extrajudicial e falência do empresário e da sociedade empresária: uma abordagem analítica. Rio Grande: Âmbito Jurídico, 2008. Disponível em: http://ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=2774