ATUALIDADES SOBRE EMPRESA INDIVIDUAL DE RESPONSABILIDADE LIMITADA (EIRELI)

Mayara Crespo Neppe
Advogada do Escritório Marcos Martins Advogados

A Lei nº 12.441 de 2011 instituiu no ordenamento jurídico brasileiro a Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (EIRELI), o que representou um grande avanço no que diz respeito à criação de um novo tipo societário a ser escolhido pelos empreendedores, de acordo com seus interesses, condições e objetivos comerciais.

Desde sua instituição no ordenamento jurídico até os dias atuais, algumas incertezas e lacunas relativas à EIRELI foram sanadas, mas ainda existem alguns pontos de divergência que merecem atenção, conforme será exposto a seguir.

Inicialmente, temos que a EIRELI, além de prevista no Código Civil Brasileiro, é regulamentada pelo DREI (Departamento de Registro Empresarial e Integração), antigo Departamento Nacional do Registro do Comércio (DNRC), que em 22 de novembro de 2011, por meio da IN 117/11, aprovou o Manual de Atos de Registro de Empresa Individual de Responsabilidade Limitada, no qual se concentravam as regras e formalidades para o registro dos atos societários perante as Juntas Comerciais Estaduais.

Trata-se de tipo societário que, assim como a figura do empresário individual, permite a atuação de uma única pessoa no exercício das atividades do negócio, porém com responsabilidade limitada ao capital social subscrito e integralizado. Logo, permite a separação de forma bem definida entre o patrimônio pessoal e o profissional, sendo que o primeiro apenas deverá ser atingido nos casos de desvio de finalidade ou confusão patrimonial, que ocasionem a desconsideração da personalidade jurídica.

Importante lembrar que ao disciplinar a EIRELI, o legislador determinou a aplicação, no que couber, das regras previstas para as sociedades limitadas, conforme artigo 980-A, parágrafo 6º do Código Civil¹, o que pode ser verificado, por exemplo, no que diz respeito à questão da limitação da responsabilidade do titular, citada acima.

Há, porém, algumas diferenças importantes relativas às sociedades limitadas, que serão abordadas a seguir.

O capital social mínimo para constituição de EIRELI não deve ser inferior a cem vezes o valor do salário mínimo vigente no País², e a integralização deste capital deve ser feita à vista, quando de sua constituição, regras estas não aplicáveis às sociedades limitadas. A respeito do capital social, a recente Instrução Normativa 47, de 3 de agosto de 2018, emitida pelo DREI, no mesmo sentido previu que o capital pode ser aumentado a qualquer tempo, contudo, deve ser inteira e imediatamente integralizado.

Há também a limitação de número de empresas no formato EIRELI que podem ser constituídas pela mesma pessoa natural, qual seja, apenas uma.

Outro aspecto interessante é que, até 2017, apenas pessoas físicas podiam ser titulares de uma EIRELI, segundo interpretação restritiva do art. 980-A do Código Civil. Ocorre que o caput do referido artigo não prevê expressamente essa proibição, sendo que apenas em seu parágrafo segundo³ é criada a restrição citada acima, de que a pessoa natural que constituir EIRELI somente poderá figurar em uma única empresa dessa modalidade. Logo, sempre foi muito defendido pelos juristas e operadores do direito a ideia de que esta restrição era aplicável às pessoas naturais, o que não implicava dizer que apenas estas poderiam ser titulares de EIRELI.

Tal problemática foi resolvida com a Instrução Normativa 38, de 2 de março de 2017, emitida pelo DREI, que alterou o Manual de Registro da EIRELI, estabelecendo que pessoas jurídicas, nacionais ou estrangeiras, igualmente tem capacidade para serem titulares deste tipo societário, segundo disposto no item 1.2.5 do Anexo V da referida instrução normativa.

A partir de então, temos pelo menos dois benefícios diretos e objetivos decorrentes da possibilidade de uma pessoa jurídica ser titular única de outra pessoa jurídica: a) evita-se o famoso “sócio de conveniência” ou mesmo aquela figura que já noutros tempos chamávamos de “laranja”, que era utilizado apenas como sócio minoritário, para meramente permitir a constituição de uma empresa de responsabilidade limitada; e b) admite-se às empresas estrangeiras a transformação de suas subsidiárias em EIRELI, podendo assim investirem e abrirem suas empresas nacionais, sem depender de sócios minoritários para tal função, o que abre caminho para diversos modelos de negócios e investimentos no país, sem maiores formalismos estatais⁴.

Importante ainda destacar que, ao interpretarmos literalmente a lei, nos deparamos com o fato de que nunca existiu qualquer vedação legal ou administrativa quanto à possibilidade de pessoa jurídica nacional ou estrangeira figurar como titular em mais de uma EIRELI, sendo a vedação expressa existente apenas em relação às pessoas naturais, conforme exposto acima⁵.

A este respeito, o 3º parágrafo do item 1.2 do Manual de Atos de Registro de EIRELI do DREI⁶, determinava que:

A constituição de EIRELI por pessoa jurídica impede a constituição de outra com os mesmos sujeitos naturais integrantes a titular, em respeito ao disposto no § 2º do art. 980-A do Código Civil.

Tal parágrafo não visava proibir a constituição de mais de uma EIRELI pela mesma pessoa jurídica, mas sim se referia à seguinte situação: uma vez criada uma EIRELI por pessoa jurídica, não podem os sócios dessa pessoa jurídica titular da primeira EIRELI, criar uma outra EIRELI, cuja titularidade seja dos sócios, pessoas naturais, que compõem o quadro societário da referida pessoa jurídica.

Desta forma, entendia-se que permanecia a inexistência de proibição legal para constituição de mais de uma EIRELI pela mesma pessoa jurídica.

Até agosto de 2018, por não ser pacífico tal entendimento, era possível defender a validade de estruturas societárias nas quais uma pessoa jurídica fosse titular de uma ou mais EIRELI, o que ficava, porém, dependente do entendimento de cada junta comercial.

Ocorre que, com a Instrução Normativa 47, de 3 de agosto de 2018, emitida pelo DREI, está agora pacificado que a pessoa jurídica pode figurar como titular em mais de uma EIRELI, nos termos do novo item 1.2 do Manual de Atos de Registro de EIRELI, entendimento este que deve ser respeitado por todas as Juntas Comerciais dos Estados brasileiros.

Outro ponto de divergência, mas ainda não plenamente sanado, se trata da inexistência de expressa previsão legal a respeito da impossibilidade de incorporação de uma sociedade por uma EIRELI, sendo que mesmo assim algumas Juntas comerciais costumam vetar tal tipo de registro, sob o argumento de que haveria uma incompatibilidade entre a natureza individual da EIRELI e o consequente recebimento, pela incorporadora, dos sócios ou acionistas da empresa incorporada.

Porém, tal situação não pode ser considerada uma regra para toda e qualquer operação societária, afinal não é obrigatório que haja o ingresso dos sócios da sociedade incorporada na incorporadora, podendo as partes envolvidas adotarem condução diferente de seus negócios.

Pelo exposto, é possível afirmar que a criação do tipo societário EIRELI trouxe vantagens ao mundo corporativo e possui alta relevância e atualidade. Porém, ainda é necessário sanar algumas inconsistências e lacunas legislativas, de forma a sempre buscar a padronização dos procedimentos de registro de tais empresas em âmbito nacional.

O escritório Marcos Martins Advogados está habilitado e à disposição para tratar de questões e dúvidas relativas à viabilidade de constituição de EIRELI e seus benefícios.

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¹Código Civil: Art. 980-A. § 6º. Aplicam-se à empresa individual de responsabilidade limitada, no que couber, as regras previstas para as sociedades limitadas.
²Código Civil: Art. 980-A. A empresa individual de responsabilidade limitada será constituída por uma única pessoa titular da totalidade do capital social, devidamente integralizado, que não será inferior a 100 (cem) vezes o maior salário-mínimo vigente no País.
³Código Civil: Art. 980-A § 2º. A pessoa natural que constituir empresa individual de responsabilidade limitada somente poderá figurar em uma única empresa dessa modalidade.
⁴YAMAGUCHI, Paulo Shigueru, 2017. Eireli com titular pessoa jurídica. Revista Eletrônica Valor Econômico, 28 de abril de 2017.
⁵ARIAS, Veronica de Lima. Pessoa jurídica, nacional ou estrangeira, pode ser titular de Eireli. Revista Eletrônica Consultor Jurídico, 18 de abril de 2017.
⁶Departamento de Registro Empresarial e Integração – DREI. Manual de Registro de Empresa Individual de Responsabilidade Limitada – EIRELI. Brasília, 2017. Disponível em: <http://www.institucional.jucesp.sp.gov.br/downloads/anexo5_eireli.pdf

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