Pedro Rezek Andery Altran
Advogado do Escritório Marcos Martins Advogados
A Lei Complementar n° 7/1970¹ instituiu o Programa de Integração Social (PIS), que tem como função promover a integração do empregado na vida e no desenvolvimento das empresas.
Já a Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (COFINS) foi criada pela Lei Complementar n° 70/1991², após a entrada em vigor da CF/88, que em seu artigo 195 possibilitou a criação de uma nova contribuição para arrecadar recursos para o custeio da previdência social, da assistência social e da saúde. Estas contribuições possuem como base de cálculo o faturamento da empresa.
Até o ano de 2003 estas contribuições seguiam a sistemática da cumulatividade, ou seja, a base de cálculo era a receita operacional bruta, sem deduções em relação a custo, despesas e encargos. Após a edição da Emenda Constitucional n° 42/03 que inseriu o parágrafo 12 no artigo 195 da Constituição Federal, houve autorização para a aplicação do regime da não-cumulatividade para o PIS e para COFINS das empresas optantes pelo lucro real.
O regime não-cumulativo, possui como objetivo evitar o efeito cascata dos tributos impedindo a incidência do mesmo tributo mais de uma vez sobre valor que já serviu de base à sua cobrança em fase anterior do processo econômico.
A forma não cumulativa só pode ser utilizada por empresas optantes pelo lucro real, possibilitando que o contribuinte se credite daquilo que é insumo.
Diante dessa possibilidade, o artigo 3° das Leis n° 10.637/2002³ e 10.833/2003⁴, garantiram a aplicação deste regime ao PIS e COFINS, respectivamente.
Art. 3° – Do valor apurado na forma do art. 2° a pessoa jurídica poderá descontar créditos calculados em relação a:
II – bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda, inclusive combustíveis e lubrificantes, exceto em relação ao pagamento de que trata o art. 2o da Lei no 10.485, de 3 de julho de 2002, devido pelo fabricante ou importador, ao concessionário, pela intermediação ou entrega dos veículos classificados nas posições 87.03 e 87.04 da TIPI.
O legislador teve como premissa tratar insumo conceitualmente e de forma abrangente, com isso ficou a critério do contribuinte e do fisco federal a tarefa de delimitar o que seria insumo.
Desde então, contribuinte e Fisco possuem entendimento diversos sobre a abrangência do que é insumo para PIS e COFINS.
De um lado, o Fisco insistia em utilizar o mesmo critério adotado para ICMS e IPI para conceituar insumo, ou seja, só seria insumo aquilo utilizado na produção da mercadoria, tendo como uma de suas principais características a perda de suas propriedades para se transformar e/ou passar a fazer parte do produto final. Não há dúvida que a aplicação deste regime jurídico restringe os créditos do contribuinte aumentando a arrecadação.
Já o contribuinte e boa parte da doutrina, entendia que insumo para PIS e COFINS seria adotar o critério da essencialidade, ou seja, tudo aquilo que for essencial para a atividade fim da empresa. Neste caso há a aplicação do regime jurídico utilizado na apuração do IRPJ.
Em razão desta divergência de entendimentos gerou muitas autuações, levando por consequência o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF a se posicionar a respeito do tema e este tribunal adotou o critério da essencialidade para conceituar insumo para PIS e COFINS, julgando favoravelmente ao contribuinte. Abaixo a ementa do julgado:
PIS/COFINS NÃO-CUMULATIVA. SEGURADORA DE GARANTIA ESTENDIDA. SERVIÇO DE VENDA DO SEGURO. GERAÇÃO DE CRÉDITO. POSSIBILIDADE.
Deve-se considerar como insumo, para fins de crédito do PIS e da COFINS não-cumulativos, todo bem ou serviço essencial à atividade da empresa. In casu, a terceirização do serviço de prospecção e de venda do seguro é imprescindível à atividade da Recorrente, motivo pelo qual se classifica como insumo e gera crédito do PIS e da COFINS não-cumulativos (Processo nº 16327.000635/2009-19, Acórdão nº 3401-002.213). (grifamos)
Esta decisão sedimentou na esfera administrativa o conceito de insumo. Até então não havia nenhuma decisão do Poder Judiciário sobre a questão, motivo suficiente para o Fisco continuar defendendo seu posicionamento.
Após anos de discussão, o Superior Tribunal de Justiça – STJ, em julgamento ocorrido na data de 24/04/2018, com repercussão geral, definiu que para fins de PIS e COFINS, o conceito de insumo deverá levar em conta o critério da essencialidade, nos seguintes moldes:
TRIBUTÁRIO. PIS E COFINS. CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS. NÃO-CUMULATIVIDADE. CREDITAMENTO. CONCEITO DE INSUMOS. DEFINIÇÃO ADMINISTRATIVA PELAS INSTRUÇÕES NORMATIVAS 247/2002 E 404/2004, DA SRF, QUE TRADUZ PROPÓSITO RESTRITIVO E DESVIRTUADOR DO SEU ALCANCE LEGAL. DESCABIMENTO. DEFINIÇÃO DO CONCEITO DE INSUMOS À LUZ DOS CRITÉRIOS DA ESSENCIALIDADE OU RELEVÂNCIA. RECURSO ESPECIAL DA CONTRIBUINTE PARCIALMENTE CONHECIDO, E, NESTA EXTENSÃO, PARCIALMENTE PROVIDO, SOB O RITO DO ART. 543-C DO CPC/1973 (ARTS. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015). 1. Para efeito do creditamento relativo às contribuições denominadas PIS e COFINS, a definição restritiva da compreensão de insumo, proposta na IN 247/2002 e na IN 404/2004, ambas da SRF, efetivamente desrespeita o comando contido no art. 3o., II, da Lei 10.637/2002 e da Lei 10.833/2003, que contém rol exemplificativo.
2. O conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios da essencialidade ou relevância, vale dizer, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de determinado item – bem ou serviço – para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte.
3. Recurso Especial representativo da controvérsia parcialmente conhecido e, nesta extensão, parcialmente provido, para determinar o retorno dos autos à instância de origem, a fim de que se aprecie, em cotejo com o objeto social da empresa, a possibilidade de dedução dos créditos realtivos a custo e despesas com: água, combustíveis e lubrificantes, materiais e exames laboratoriais, materiais de limpeza e equipamentos de proteção individual-EPI.
4. Sob o rito do art. 543-C do CPC/1973 (arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015), assentam-se as seguintes teses: (a) é ilegal a disciplina de creditamento prevista nas Instruções Normativas da SRF ns. 247/2002 e 404/2004, porquanto compromete a eficácia do sistema de não-cumulatividade da contribuição ao PIS e da COFINS, tal como definido nas Leis 10.637/2002 e 10.833/2003; e (b) o conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios de essencialidade ou relevância, ou seja, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de terminado item – bem ou serviço – para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo Contribuinte.
(REsp 1221170/PR, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/02/2018, DJe 24/04/2018)
Esta decisão, embora tenha sido mais favorável ao contribuinte pela extensão adotada, não trouxe nenhum critério objetivo de definição de insumo. Foi instituído um regime próprio de apuração para o PIS e a COFINS, qual seja a o critério da essencialidade do insumo para a atividade da empresa.
Com a adoção do critério da essencialidade evidente que o direito ao crédito deverá ser analisado caso a caso, não existindo um rol taxativo do que é essencial para cada empresa, sendo necessário uma análise detalhada de cada processo produtivo, ou aspectos inerentes à comercialização ou prestação de serviços.
Desta forma, claro está que tanto a esfera administrativa representada pelo CARF como a esfera judicial com decisão do STJ adotaram novo regime de apuração para tomada de crédito de PIS e COFINS, qual seja, o critério do produto adquirido ou serviço tomado ser essencial para a atividade empresarial.
¹BRASIL. Lei Complementar n° 7/1970, de 07 de set. de 1970. Institui o Programa de Integração Social, e dá outras providências, Brasília, DF, set 1970
²BRASIL. Lei Complementar n° 70/1991, de 30 de dez. de 1991. Institui contribuição para financiamento da Seguridade Social, Brasília, DF, dez 1991
³BRASIL. Lei n° 10.637/2002, de 30 de dez. de 2002. Dispõe sobre a não-cumulatividade na cobrança da contribuição para os Programas de Integração Social (PIS) e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep), Brasília, DF, dez 2002
⁴BRASIL. Lei n° 10.833/2003, de 29 de dez. de 2003. Altera a Legislação Tributária Federal e dá outras providências, Brasília, DF, dez 2003