Crise no agronegócio e o reflexo nas relações trabalhistas

Crise no agronegócio e as relações trabalhistas

Depois de anos de excelentes resultados, o agronegócio brasileiro enfrentou uma crise sem precedentes, impulsionada por uma combinação de fatores econômicos e ambientais. O aumento expressivo nos preços dos insumos, somado à queda no valor das commodities devido ao aumento dos estoques mundiais, além de uma seca prolongada que atinge diversas regiões do Brasil, comprometeu a produtividade e agravou a situação financeira dos produtores rurais.

Esse cenário complexo e desfavorável culminou em um aumento expressivo nos pedidos de recuperação judicial entre os produtores rurais, com crescimento de 523% no último ano, segundo dados do setor, evidenciando a situação crítica que o agronegócio brasileiro enfrenta atualmente.

No entanto, apesar do considerável aumento dos pedidos de recuperação judicial em comparação com o ano anterior, eles representam apenas 0,000025% se comparado ao total de produtores brasileiros. Ou seja, em um país com cerca de 3,5 milhões de produtores individuais, aproximadamente 30 mil poderiam utilizar a recuperação judicial como um meio adequado e necessário para a reorganização financeira. No entanto, apenas 127 realizaram o pedido de recuperação judicial em 2023, representando cerca de 0,4%.

Apesar disso, o alerta acendeu após os pedidos de recuperação judicial das empresas AgroGalaxy, com uma dívida de R$ 4,6 bilhões abrangendo bancos, fornecedores e funcionários, e Portal Agro, com dívida de R$ 700 mil. Essas empresas, importantes no setor, acumularam passivos significativos em razão das condições econômicas e climáticas desfavoráveis, recorrendo à recuperação judicial para evitar a falência.

Em termos gerais, a recuperação judicial é um recurso legalmente admitido que permite ao produtor rural altamente endividado a chance de reestruturar suas dívidas, protegendo seu patrimônio e garantindo a continuidade das atividades, evitando assim a falência.

No Brasil, a Lei n.º 11.101/05 regulamenta a recuperação judicial e a falência, sendo que a primeira se destina a evitar a segunda, permitindo que a empresa apresente um plano de reestruturação de suas dívidas, incluindo uma renegociação com credores e empregados, para que se estabeleça um cronograma de pagamentos que permita a continuidade das atividades.

Como foi o caso da AgroGalaxy, não é incomum que empresas entrem com o pedido de recuperação judicial e, entre suas dívidas, há valores a serem pagos à título de débitos trabalhistas.

Para quitação desses valores, diversas características devem ser observadas, como por exemplo, aos credores trabalhistas, é permitida a habilitação de seus créditos já reconhecidos em juízo perante o administrador judicial no processo cível. Além disso, as ações trabalhistas em andamento, prosseguirão perante a Justiça do Trabalho, até o reconhecimento do direito e a quantificação do valor devido, para, então, ser habilitado o valor no juízo cível, respeitando o plano recuperacional.

Há também, no plano de recuperação judicial, em geral, o prazo de um ano para pagamento dos créditos trabalhistas e os decorrentes de acidentes de trabalho, vencidos até a data do pedido de recuperação judicial. No entanto, os créditos de natureza exclusivamente salarial, de até cinco salários-mínimos, vencidos nos três meses anteriores ao pedido de recuperação judicial, deverão ser pagos dentro de trinta dias.

Há diversos outros aspectos importantes em relação à recuperação judicial e às relações trabalhistas, por isso, esse processo pode gerar incertezas para os empregadores e empregados, já que a legislação estabelece a prioridade dos créditos trabalhistas no plano recuperacional, significando que, em caso de inadimplência, os trabalhadores têm prioridade sobre outros credores. No entanto, enfrentam a possibilidade de atrasos nos pagamentos, benefícios e rescisões, isto porque, durante o processo de recuperação judicial, as ações e execuções ficam suspensas por 180 (cento e oitenta) dias, contados a partir do deferimento do processamento da recuperação judicial.

Além dos riscos de inadimplência, a recuperação judicial impacta diretamente na manutenção dos postos de trabalho. Em muitos casos, os empregadores são obrigados a reduzir o quadro de empregados ou a renegociar condições laborais, o que pode ser complexo, especialmente em um setor que depende de mão de obra temporária e sazonal, como o agronegócio.

A recuperação judicial, quando utilizada de maneira estratégica, pode ser a diferença entre a falência e a continuidade de um negócio rural. Para os produtores rurais que estão enfrentando dificuldades financeiras, quanto antes buscarem orientação especializada, melhores serão as chances de reorganizar as finanças e garantir a continuidade das atividades.

Diante desse cenário, a implementação de estratégias preventivas é fundamental para que as empresas no agronegócio enfrentem períodos de crise de forma mais resiliente.

Em caso de dúvidas sobre o tema, nossa equipe Trabalhista está à disposição para esclarecer.

Compartilhe nas redes sociais