DA LEGALIDADE DE NOVA ASSEMBLEIA GERAL DE CREDORES EM CASO DE DESCUMPRIMENTO DO PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL APROVADO

Thyago Rodrigo da Cruz
Advogado do Escritório Marcos Martins Advogados

Muito se discute, atualmente, sobre a legalidade de um plano de recuperação judicial prever em seu bojo que, em caso de descumprimento de quaisquer de suas disposições, o devedor empresário beneficiado pelo referido concurso de credores, o respectivo administrador judicial ou, ainda, os próprios credores poderem convocar, em regime de urgência, nova Assembleia Geral de Credores para deliberar a respeito da viabilidade da falência da empresa ou, até mesmo, debater eventual alteração do plano aprovado, evitando-se uma quebra maléfica a todos os envolvidos.A discussão ganha força especialmente porque a Lei nº 11.101/2005, regente de todo o sistema de falências e recuperações judiciais e extrajudiciais de empresas no Brasil, é sobremaneira taxativa ao determinar em seu artigo 73, inciso IV, que “o juiz decretará a falência durante o processo de recuperação judicial por descumprimento de qualquer obrigação assumida no plano de recuperação, na forma do §1º do art. 61 desta Lei”.

Note-se que o legislador não atribuiu ao juiz a possibilidade de ponderar a respeito da quebra da empresa que deixa de cumprir as obrigações previstas em seu plano de recuperação judicial. Assevera-se que “o juiz decretará a falência”, portanto, em tese, de um dever do julgador.

Ocorre que a beleza do Direito se encontra em suas nuances, sutilmente descobertas a partir do firme compromisso do intérprete de analisar a norma jurídica de acordo com a lógica do sistema instituído, dando a melhor solução ao aparente conflito entre normas.

Daí porque, já há muito, Carlos Henrique Abrão, um dos maiores estudiosos de nosso país na área de falências e recuperações judiciais e extrajudiciais de empresas, ao analisar o supramencionado artigo 73, inciso IV, da Lei nº 11.101/2005, alertava que “o tom imperativo redacional merece ser temperado entre a realidade da empresa e o incumprimento constatado, de modo a ser aberto prazo para manifestação do interessado e a finalidade de esclarecer, justificando o motivo pelo qual deixou de atender a determinação”¹.

O motivo ensejador de tal ponderação, acertadamente, cinge-se ao princípio da preservação da empresa, instituído pelo artigo 47 da Lei nº 11.101/2005 e, ainda, ao da soberania das decisões assembleares que, diga-se de passagem, já influenciam positivamente as decisões das Câmaras Reservadas de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que começam a compreender pela possibilidade de análise acerca da viabilidade de eventual quebra, quer seja por parte da Assembleia Geral de Credores (Agravo de Instrumento nº 2229786-18.2016.8.26.0000) ou, ainda, por parte do próprio juízo da recuperação judicial (Agravo de Instrumento nº 2111038-90.2017.8.26.0000).

Trata-se, portanto, de uma mudança do entendimento jurisprudencial que, não obstante seja recente, mostra-se por absolutamente substancialmente positiva, beneficiando não apenas o devedor empresário mas, em última análise, toda a coletividade de credores e a própria sociedade, na medida em que os nefastos efeitos imediatamente emanados da convolação da recuperação judicial em falência, a saber, o encerramento das atividades empresárias, a ensejar a consequente paralização da circulação de riquezas, o término dos fatos geradores de tributos e, principalmente, a extinção de inúmeros postos de trabalho, sem sombra de dúvida, a ninguém aproveita.

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¹ABRÃO, Carlos Henrique. Comentários ao Capítulo IV: da convolação da recuperação judicial em falência. TOLEDO, Paulo Fernando Campos Salles de Toledo et al. (Coords.). Comentários à Lei de recuperação de empresas e falência. 4. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 282.

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