Carlos Alexandre Basílio
Advogado do Escritório Marcos Martins Advogados
É cada vez mais inquestionável que com toda a facilidade proporcionada pelas plataformas digitais, as redes sociais contribuem de forma bastante significativa na exposição das marcas, seja positiva ou negativamente. Com consumidores cada vez mais conectados, as avaliações online passaram a ocupar o lugar da famosa “propaganda boca-a-boca”. Na chamada era da “avaliação online”, os consumidores por meio de seus relatos acabam sendo formadores de opinião na internet de modo que suas postagens sobre as empresas são levadas em consideração por milhares de outros consumidores (uma vez que por meio da análise das avaliações deixadas na internet os demais consumidores embasarão a decisão de compra).
Por essa razão, os relatos disponibilizados na rede mundial de computadores possuem relevante importância, de modo que alegações inverídicas, ofensas, ilações e falsas acusações são capazes de gerar danos irreversíveis à empresa maculada. De acordo com a professora Sandra Salgado, especialista em mídia digital,
A opinião do público é difundida cada vez mais facilmente por meio de blogs, websites de relacionamento e outras formas de conectividade, aumentando a complexidade do contexto e dos fatores externos que influenciam os hábitos dos consumidores.¹
A proteção à imagem e honra é prevista na forma de direitos fundamentais de personalidade, dispostos categoricamente nos incisos V e X, do art. 5º da Constituição Federal que disciplina que “(…)V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem;” e que “X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.
Deste modo, conforme preceitua o hoje ministro do STF, quando então professor Constitucionalista, Alexandre de Moraes
a proteção constitucional consagrada no inciso X do art. 5º refere-se tanto às pessoas físicas como jurídicas, abrangendo inclusive, à necessária proteção à própria imagem frente aos meios de comunicação em massa (televisão, rádio, jornais, revistas, etc.).²
Consoante tal interpretação do texto da Carta Magna, o legislador infraconstitucional, por meio dos artigos 17 e 20 do Código Civil, previu expressamente a aplicabilidade à pessoa jurídica ao dispor que “O nome da pessoa não pode ser empregado por outrem em publicações ou representações que a exponham ao desprezo público, ainda quando não haja intenção difamatória.” Bem como que “a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais.”
Em continuidade, o art. 52 disciplinou que “Aplica-se às pessoas jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos da personalidade.” Não obstante, entende-se que a realização e manutenção de postagens ofensivas na rede mundial de computadores também viola frontalmente o Código de Defesa do Consumidor (Lei Federal nº 8078/90), visto que os consumidores da empresa ofendida poderão ser induzidos a erro, tendo em vista que serão levados a acreditar que as “informações” ali disponibilizadas pelo ofensor são verdadeiras.
A título de exemplo citemos os casos de grande repercussão midiática da Escola Base (onde os funcionários foram acusados de abusos sexuais aos alunos) e o tal Hambúrguer da rede de fast-food Mc Donald ´s que seriam feitos de minhocas. Ao final descobriu-se que ambos eram fatos inverídicos, todavia trouxeram uma enorme repercussão negativa às empresas.
É crucial que se tenha em mente que ao propagar ofensas e inverdades através da internet, os usuários agravam demasiadamente a situação da empresa ofendida, uma vez que a internet representa campo de comunicação global e sem fronteiras, atingindo milhões de pessoas em um curtíssimo espaço de tempo.
Por essa razão, ainda que seja constitucionalmente garantido aos brasileiros o direito de crítica e manifestação, a prática de atos que levem à macula do nome comercial das empresas deve ser tolhida pelo Poder Judiciário.
O Tribunal de Justiça de São Paulo, ao enfrentar o presente tema, vem entendendo pela necessidade de indenização à parte ofendida diante da existência de postagem de conteúdo ofensivo na internet. A seguir alguns trechos de julgados debatendo a questão:
O direito de crítica não é absoluto e a prova existente é eficaz para a verossimilhança da alegação de abuso, de onde decorre também o risco de dano de difícil reparação pela possibilidade de perda de faturamento e destruição da imagem da agravada;³
As expressões utilizadas pelo réu, ao se referir à autora, não são abonadoras da sua conduta, ao contrário, depreciam sua imagem. Ponderação do direito constitucional de liberdade de expressão frente a outros direitos. Os insultos, diretos e indiretos, aos atributos da apelante geraram mácula à honra. Incidência do artigo 187 do Código Civil, ante a ocorrência de abuso de direito por parte do apelado que justifica a compensação por dano moral.⁴
A utilização de meios informáticos, como opção para denunciar o que entende por irregularidade ou incapacidade profissional, ao invés de recorrer ao sistema de proteção ao consumidor ou mesmo à esfera judicial, representa a tentativa de propagar a partir de interpretação pessoal e unilateral eventuais danos ou inadequação ao exercício e ao cumprimento de contratação profissional. Esta atitude gera consequências mais profundas, tornando difícil obstá-la, desta forma, o propagador assume o risco de produzir resultados. Correto se apresenta, a reclamação, explicitados os defeitos do objeto ou da prestação de serviço, elencá-los, esmiuçá-los e denunciar o descumprimento de cláusula de prazo vinculada a contrato. O mais, é excesso e atinge a honorabilidade de pessoas ou da empresa, merecendo, portanto, ressarcimento, à vítima por ofensa à honorabilidade pessoal ou profissional.⁵
Há de se notar que o Tribunal de Justiça Paulista chancela e reconhece o direito à indenização quando há extrapolação do direito de crítica pelo consumidor, fato esse que macula o nome e reputação comercial da empresa ofendida.
Não obstante, a necessidade de proteção ao nome e reputação comercial da empresa é também indispensável que seja protegida a sua reputação online, intimamente ligada ao seu nome comercial. As informações online de uma empresa podem impactar diretamente na escolha de um consumidor, já que, segundo estudos, 90% dos consumidores pesquisam na internet antes de realizar uma compra. Assim, o que as pessoas encontram na internet sobre determinada marca vai impactar diretamente nos ganhos e rentabilidade da empresa.
O consumidor de hoje, sempre ligado à internet (para isso basta ter um celular smartphone em mãos) recorre a opiniões, comentários em sites, vídeos, redes sociais e aplicativos, para realizar comparações, estabelecer parâmetros e optar entre diversos concorrentes.
Por essa razão, é legítima a intervenção judicial de modo a cessar a conduta lesiva quando houver ofensas às empresas na internet, cuja repercussão negativa pode vir a ser irreversível, protegendo assim o nome e reputação comercial da empresa ofendida. Não obstante, caberá sempre à empresa ofendida o direito à reparação através da indenização pelos danos ocorridos, tendo em vista que a mesma proteção conferida à pessoa natural deverá também ser aplicada às pessoas jurídicas.
¹NEVES, Andressa. Relação com o consumidor: impactos das redes sociais no comportamento de consumo. Canaltech, 2016. Disponível em: < https://canaltech.com.br/redes-sociais/redes-sociais-os-novos-comportamentos-de-compra-e-consumo-70329/>. Acesso em: 10 mai. 2018.
²In Direito Constitucional, 11ª Ed., São Paulo; Atlas, 2012, pág. 79
³TJSP; Agravo de Instrumento 2006088-35.2014.8.26.0000; Relator (a): Maia da Cunha; Órgão Julgador: 4ª Câmara de Direito Privado; Foro de Matão – 1ª Vara.
⁴0009095-16.2014.8.26.0438 – Apelação / Indenização por Dano Moral – Relator(a): James Siano Comarca: Penápolis – Órgão julgador: 5ª Câmara de Direito Privado – Data do julgamento: 06/08/2016.
⁵TJSP; Apelação 9171867-69.2004.8.26.0000; Relator (a): Caetano Lagrasta; Órgão Julgador: 8ª Câmara de Direito Privado; Foro de Bauru – 2.VARA CIVEL