Multa qualificada: STF limita à 100% da dívida tributária

O que é a multa qualificada?

A multa qualificada consiste em uma penalidade decorrente de sonegação, fraude ou conluio, incidente sobre a totalidade ou diferença do tributo não pago, não recolhido, não declarado ou declarado de forma inexata, cujo objetivo é coibir a prática de condutas ilícitas por parte do contribuinte.

Principais motivos para a sua aplicação

Sonegação: ação ou omissão com o objetivo de impedir ou retardar o conhecimento por parte do Fisco da ocorrência do fato gerador de alguma obrigação tributária principal (impostos ou taxas, por exemplo), sua natureza, circunstâncias materiais ou, ainda, das condições pessoais de contribuinte, que podem afetar o cumprimento da obrigação tributária principal.

Fraude: ação ou omissão que visa impedir ou retardar a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária principal, ou a excluir ou modificar as suas características essenciais, de modo a reduzir o montante do imposto devido para evitar ou adiar o seu pagamento.

Conluio: ação ou ajuste intencional entre duas ou mais pessoas naturais ou jurídicas, visando qualquer dos efeitos das práticas da sonegação ou fraude.

São exemplos destas práticas: declarações falsas ou omissão de informações em documentos fiscais, alterações de faturas de operações com o objetivo de fraudar o Fisco, alteração de despesas visando maior redução de tributos ou até mesmo a reunião de empresas de um determinado ramo/mercado buscando prejudicar ou lesar terceiros.

Julgamento pelo STF

Ao longo dos anos, a controvérsia sobre a constitucionalidade da multa qualificada tem sido tema de intensos debates no Poder Judiciário. O princípio do não confisco, existente na Constituição Federal, tem sido invocado em diversas ocasiões diante da aplicação de penalidades que, por vezes, superam o próprio valor do tributo devido pelo contribuinte.

Em 2015, o STF, reconhecendo a relevância e a complexidade do assunto, decidiu pela Repercussão Geral do Tema nº 863 (cuja decisão se estenderá para todos os processos que discutem este tema), com o objetivo de unificar o entendimento sobre os critérios de aplicação da multa qualificada. Em resumo, a discussão visava verificar a razoabilidade da aplicação de multa no percentual de 150% sobre o tributo não pago ou sobre sua diferença não declarada.

Contudo, a Lei nº 14.689/2023 adiantou-se ao STF e trouxe importantes alterações ao cenário jurídico ao modificar o §1º do artigo 44 da Lei nº 9.430/1996, reduzindo em 1/3 o valor da multa qualificada e assegurando a retroatividade da legislação mais benéfica. Importante mencionar que a referida legislação se aplica somente às multas tributárias aplicadas no âmbito federal.

Isto significa dizer que, com a nova redação, nos casos de prática de sonegação, fraude ou conluio, a penalidade máxima a ser aplicada pela Receita Federal do Brasil foi reduzida de 150% para 100% do crédito tributário apurado. Desta forma, ficam cancelados os valores que excederem a esse percentual.

No que se refere à reincidência, isto é, quando comprovada nova prática de sonegação, fraude ou conluio, no período de 2 anos, a multa será de 150%.

No julgamento do recurso extraordinário paradigma (RE nº 736.090), realizado em 03 de outubro de 2024, o Plenário do STF, por unanimidade,  aplicou a nova redação da mencionada lei ao tema e limitou a multa para o percentual de 100% do valor do tributo, sendo possível que o valor chegue a 150% da dívida nas hipóteses de reincidência.

A limitação, que já era aplicável no âmbito federal por força da Lei nº 14.689/2023, foi estendida aos Estados e aos Municípios, de modo que as multas ficam limitadas a 100% do tributo até que seja editada lei complementar federal sobre a matéria.

O julgamento, ainda, modulou os efeitos da decisão para estabelecer que ela passe a produzir efeitos a partir da edição da Lei nº 14.689/2023, sendo mantidos os patamares atualmente fixados pelos entes federados até os limites da tese.

Na prática, a decisão não muda o cenário dos contribuintes autuados pelo fisco federal, que já aplicava a limitação da Lei nº 14.689/2023, mas beneficiou os contribuintes que tenham sofrido autuações fiscais pelos Estados e Municípios da federação, uma vez que poderão solicitar a restituição dos valores pagos indevidamente desde 21 de setembro de 2023.

Os contribuintes que ajuizaram ações judiciais ou processos administrativos antes da edição da Lei 14.689/2023 ficaram de fora da regra de modulação, podendo receber a devolução dos valores pagos indevidamente antes de setembro de 2023. Ainda pairam dúvidas sobre a possibilidade de os Estados e Municípios autuarem contribuintes em relação  a fatos geradores ocorridos antes da Lei 14.689/2023.

Em caso de dúvidas, nossa equipe tributária está à disposição para esclarecimentos e orientações.

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