Priscilla Folgosi Castanha
Advogada do Escritório Marcos Martins Advogados
A Lei de Falências e Recuperação de Empresa – Lei n. 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, alterou profundamente a legislação falimentar brasileira. Desapareceram as concordatas preventiva e suspensiva, substituída a primeira pela denominada recuperação judicial, que objetiva viabilizar a superação de crise econômica do devedor, promovendo, desta maneira, a preservação da empresa, como sublinha o art. 47, da referida lei:
A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação de crise econômico-financeira do devedor, à fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estimulo à atividade econômica.
Conveniente registrar que na recuperação judicial, em princípio, o empresário ou seus administradores não são afastados da gestão da sociedade, mas passa a ser fiscalizado, pelo administrador judicial.
Tal como ocorria sob a égide da legislação anterior, a legislação atual constitui, em razão da natureza da obrigação, preferência e privilégios a vários créditos, das quais resultam preferências e vantagens de alguns credores sobre outros, dentre eles os credores trabalhistas.
Na recuperação judicial o devedor, terá o prazo máximo de um ano para o pagamento dos débitos trabalhistas, vencidos até a data do pedido de recuperação:
Art. 54 – O plano de recuperação judicial não poderá prever prazo superior a 1 (um) ano para pagamento dos créditos derivados da legislação do trabalho ou decorrentes de acidente de trabalho vencidos até a data do pedido de recuperação judicial.
Já o parágrafo único do citado dispositivo legal, estabelece os créditos trabalhistas que devem ser pagos em trinta dias:
Parágrafo único – O plano não poderá, ainda, prever prazo superior a 30 (trinta) dias para o pagamento, até o limite de 5 (cinco) salários-mínimos por trabalhador, dos créditos de natureza estritamente salarial vencidos nos três meses anteriores ao pedido de recuperação judicial.
Desta forma, na recuperação judicial, o devedor deverá pagar, no prazo de um ano, as verbas salariais e indenizatórias porventura devidas a seus empregados, e, até trinta dias, para o pagamento de verbas estritamente salariais, vencidas nos três meses anteriores ao pedido de recuperação judicial – observado o limite de cinco salários mínimos por trabalhador.
Importante frisar, todavia, que os créditos trabalhistas constituídos após o pedido de recuperação judicial não farão parte do plano e nem sofrem os seus efeitos, tendo forma privilegiada de pagamento como crédito extraconcursal. Assegurados, portanto, aos empregados que tenham seus contratos de trabalho rescindidos após o pedido de recuperação judicial, o pagamento da integralidade de seus créditos trabalhistas.
A exceção lógica é se houver a convalidação da recuperação judicial em falência, quando o crédito trabalhista novamente vem a ser atingido pelas restrições legais.
Isto acontece porque o artigo 49 da Lei de Recuperação e Falência dispõe que “estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos”, razão pela qual se pode concluir que ficam excluídos os créditos trabalhistas constituídos após o deferimento da recuperação judicial, isso por que a recuperação judicial não interfere na execução dos contratos bilaterais, dentre eles os trabalhistas, que continuam a surtir seus efeitos jurídicos, mesmo depois de deferida a medida.
A Lei de Recuperação e Falência, inclusive, para viabilizar a recuperação judicial e a continuidade da empresa, possibilita que se inclua no plano de recuperação a redução de direitos trabalhistas, cuja validade depende, logicamente, de prévia e obrigatória negociação coletiva.
Neste sentido destaque-se o artigo 50, item VIII, da Lei de Recuperação e Falência o qual dispõe que “constituem meios de recuperação judicial, observada a legislação pertinente a cada caso, dentre outros: inciso VIII: redução salarial, compensação de horários e redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva”.
Já o crédito judicial trabalhista só se torna liquido quando o valor da condenação for fixado por sentença, o que significa que as ações trabalhistas não se suspendem com o deferimento do pedido de recuperação. As ações prosseguirão na Justiça do Trabalho naquele Juízo, até a apuração do valor da condenação e inscrição no quadro-geral de credores pelo valor determinado em sentença.
Destaque-se que o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição de todas as ações e execuções em face do devedor, pelo prazo improrrogável de 180 (cento e oitenta) dias, contados do deferimento, restabelecendo-se, após o decurso do prazo, o direito dos credores de iniciar ou continuar suas ações e execuções, independentemente de intimação judicial.
Não há, segundo entendimento majoritário, necessariamente, suspensão imediata das causas trabalhistas já ajuizadas, que, com a prescrição suspensa, continuam tramitando, sendo que após a liquidação do crédito trabalhista, será o mesmo habilitado no juízo universal.
As breves considerações aqui trazidas evidenciam que a Lei de Recuperação de Empresas e Falência modernizou o Direito Empresarial e tornou imperativa, diante de seus reflexos, a atualização do Direito do Trabalho para absorção de suas influências sobre importantes institutos trabalhistas, tais como sucessão de empregadores, formação de grupo econômico e despersonalização da figura do empregador, cujo enfrentamento é inevitável quando se busca a efetiva preservação da empresa e, consequentemente, do trabalho.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA Amador Paes de. Os direitos trabalhistas na recuperação judicial e na falência do empregador. Disponível em: <http://www.mackenzie.br/fileadmin/Graduacao/FDir/Artigos/amador.pdf>. Acesso em: 22 jun. 2014.
KONRAD. Carlos Bender. A recuperação judicial de empresas e a execução do crédito trabalhista. Algumas questões controvertidas. Disponível em: <http://www3.pucrs.br/pucrs/files/uni/poa/direito/graduacao/tcc/tcc2/trabalhos2012_2/carlos_konrad.pdf>. Acesso em: 22 jun. 2014.