Vitor José Ferreira do Couto
Advogado do Escritório Marcos Martins Advogados
Em recente julgado, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo[1] manteve decisão do juiz de primeiro grau confirmando a homologação de plano de recuperação aprovado pelo instituto do cram down, o qual autoriza o juiz a homologar o plano de recuperação judicial mesmo sem a aprovação de todas as classes de credores, desde que preenchidos os requisitos do artigo 58 da Lei nº 11.101/05.
Na decisão, o TJSP concordou com a aplicação do cram down em caráter excepcional, ou seja, após análise detida do caso concreto. A aprovação “forçada” do plano visa manter a atividade empresarial do estabelecimento comercial, com o fito de proteger o maior número de empregados, fornecedores e credores possíveis, quando verificada a total viabilidade do plano de recuperação judicial.
No caso específico, a recuperação judicial tem a peculiaridade de conter apenas 2 (duas) classes de credores, sendo que, se considerada a votação por número de credores, o plano foi aprovado por 100% da classe IV quirografários de microempresas e por 76,47% da classe III quirografários. No que tange à aprovação do plano pelo valor do crédito, houve aprovação de 100% pela classe IV e de tão somente 38,14% pela classe III.
Em outras palavras, houve aprovação quantitativa do plano, mas não qualitativa, em razão do valor do crédito de apenas dois Bancos, credores da classe III, os quais, no entendimento do TJSP, abusaram, deliberadamente, do direito de voto, pois teriam interesse na decretação da falência da recuperanda.
A 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do TJSP entendeu que o Banco agravante votou contrariamente à aprovação do plano sem qualquer fundamento. Quando instado a se manifestar nos autos originários, não apresentou nenhum argumento que demonstrasse a inviabilidade do plano, nem sequer se mostrou aberto para negociação dos termos do plano, configurando, portanto, o abuso do direito de voto.
Na decisão em comento, o TJSP destacou a excepcionalidade da medida e a razoabilidade da aprovação do plano que se mostrou plenamente viável e benéfico para a grande maioria dos credores. Por isso o cram down foi aplicado com base no artigo 187, do Código Civil, que prevê que o exercício regular de um direito – no caso, o direito de voto do credor – pode configurar ato ilícito (abuso) quando, manifestamente, exceder os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
A decisão em análise é importantíssima, pois levou em consideração o fato de que, no caso concreto, a homologação do plano de recuperação pelo cram down beneficia não só as recuperandas, mas, sobretudo, os empregados e os credores que aprovaram o plano, pois se preservará a atividade econômica e, por conseguinte, serão mantidos os empregos pelos quais são responsáveis, direta e indiretamente, observando-se um impacto positivo em toda a sociedade.
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[1] TJSP – Agravo de Instrumento nº 2122678-85.2020.8.26.0000